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Brasil e Estados Unidos: aproximação bilateral em Defesa no pós-impeachment



Desde o início do governo de Michel Temer e da gestão de Raul Jungmann no Ministério da Defesa, houve certas modificações no posicionamento internacional brasileiro que incorrem em aproximação aos Estados Unidos. Não se trata de ruptura total, haja vista que a preservação de boas relações bilaterais com a potência é uma preocupação constante dos governos e burocracias brasileiros. Contudo, algumas ações empreendidas durante o mês de novembro demonstram a maior convergência de visão de mundo e a abertura do país para a potência norte-americana.


A realização de um exercício multilateral inédito na Amazônia, com a participação de Estados Unidos, Peru e Colômbia é relevante nesse sentido. O exercício, que teve início no dia 11 de novembro, buscava “desenvolver doutrina para ações humanitárias que respondam de forma rápida a adversidades causadas por ondas migratórias, catástrofes e acidentes”. Embora sejam comuns os exercícios conjuntos, a realização na região amazônica com a presença de potências globais é uma novidade e o episódio mostra o distanciamento da postura de anos anteriores. A Estratégia Nacional de Defesa de 2008, por exemplo, apresentava como hipótese de emprego “a ameaça de forças militares muito superiores na região amazônica”. A sentença deixava implícita a desconfiança frente a possíveis ataques à soberania nacional por parte de potências mundiais, notadamente os Estados Unidos.


A agenda de Jungmann durante sua visita a Washington, de 14 a 17 de novembro, também revela a aproximação. Na ocasião, Jungmann propôs que o Brasil e os Estados Unidos adotassem uma política de Estado sobre cooperação bilateral, estável e duradoura. Também buscou negociar o uso da base de lançamento de Alcântara pela potência. Nesse caso, já havia sido assinado um acordo bilateral nos anos 1990, que foi retirado do Congresso no início da presidência de Lula, em 2003, antes de ser ratificado. Contudo, não se trata de um retorno àquela década, uma vez que o governo atual não pretende conceder o monopólio aos EUA. Rússia, China, Israel e França também possuem interesse em utilizar o centro de lançamentos do estado do Maranhão.


A cooperação regional também passa por importante mudança de orientação, aproximando-se da perspectiva dos Estados Unidos. Durante sua visita aos EUA, o ministro abordou com o subsecretário de Estado para Assuntos Políticos dos Estados Unidos, Thomas A. Shannon Jr., a criação de uma Autoridade de Segurança Sul-Americana. A iniciativa é conduzida em parceria com o Ministério das Relações Exteriores e nas palavras de Jungmann, trata-se de uma “proposta coletiva da área de Defesa, Justiça e Inteligência” para o compartilhamento de informações e troca de experiências de êxito no combate ao crime transnacional. Assim, participariam do organismo tanto ministros da área de segurança pública quanto de defesa.


Embora o ministro argumente que possa ser criado um organismo semelhante ao Conselho de Defesa Sul-americano (CDS), as diferenças são marcantes. O CDS propunha uma agenda que separava temas tradicionais de defesa e aqueles de segurança pública. Assim, contrastava com a agenda norte-americana, na qual o crime organizado transnacional é entendido como uma das principais ameaças à região e a atuação conjunta interagências, com a participação de policiais e militares, é vista como o mecanismo ideal para seu combate. Nesse sentido, a criação do CDS representava a busca de autonomia e de uma orientação regional autóctone nessa área. Por outro lado, a iniciativa proposta por Jungmann e Aloysio Nunes incorpora a agenda debatida nas organizações hemisféricas e representa uma aproximação à agenda de segurança da potência.


Tais iniciativas explicitam que a agenda internacional de Defesa brasileira liderada por Jungmann pauta-se, entre outros aspectos, na busca de aproximação bilateral com os Estados Unidos. Nesse processo, a América do Sul não fica excluída ou marginalizada, mas é entendida a partir de um novo prisma. A cooperação regional continua presente, porém com outra orientação. Não se trata de buscar autonomia frente à potência ou de criar um espaço geopolítico próprio, mas de garantir a estabilidade regional e o combate conjunto ao narcotráfico de acordo com os preceitos do Norte, em um processo de aceitação e busca de cooperação iniciado pelo Brasil. Tampouco, há maiores preocupações com as consequências do emprego militar no combate ao narcotráfico, que tende a gerar retrocessos em questões de direitos humanos, e policialização das Forças Armadas, que são desviadas de sua função principal: a defesa contra ameaças militares externas.



Lívia Milani é doutoranda em Relações Internacionais pelo PPG RI San Tiago Dantas - UNESP-UNICAMP-PUC-SP, pesquisadora do Grupo de Estudos em Defesa e Segurança Internacional (GEDES) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU). É bolsista Fapesp.


Imagem: Em Washington Jungmann esteve em reunião com o setor aeroespacial privado norte-americano. Por: Ministério da Defesa.




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