top of page

As eleições presidenciais no Haiti e a Minustah

Em meio a uma crise política no Haiti, as eleições presidenciais do segundo turno – que deveriam ter ocorrido originalmente no dia 27 de dezembro de 2015 – foram adiadas novamente [1]. Diante das tensões entre os partidos políticos envolvidos nas disputas eleitorais, o Executivo e o Parlamento decidiram constituir um governo provisório durante 120 dias até que seja possível realizar o segundo turno. Enquanto o novo presidente do Haiti não é eleito, o país será governado pelo presidente interino, Jocelerme Privert, eleito no dia 14 de fevereiro pela Assembleia Nacional.


Os primeiros indícios da crise política no Haiti ocorreram em agosto de 2015, durante o segundo turno das eleições parlamentares e o primeiro turno da corrida presidencial, época em que a violência aumentou. A oposição política do país já havia reclamado de fraude eleitoral no primeiro turno: eleitores votando mais de uma vez, pagamento de propina a autoridades eleitorais e adulteração de cédulas e folhas de apuração. De fato, a Organização dos Estados Americanos (OEA) verificou irregularidades no decorrer das votações. Mesmo assim, o resultado do primeiro turno foi mantido: Jovenel Moïse, com o apoio do ex-presidente Michel Martelly [2], obteve 32% dos votos e o candidato da oposição, Jude Célestin, obeteve 25%.


Segundo o general brasileiro no Haiti, Ajax Pinheiro, a aproximação do segundo turno reavivou as tensões. Grupos armados ligados a partidos políticos entraram em choque entre si e gangues tentaram incendiar locais de votação como protesto pelo conturbado resultado do primeiro turno.


Esse cenário de instabilidade é preocupante não só para o Haiti e seus cidadãos como também para o trabalho da Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti (Minustah) cuja função atual é apoiar a Polícia do país, conter a violência e garantir que as eleições sejam realizadas de forma segura. O Brasil lidera a Minustah há 11 anos, atuando na desarticulação de grupos armados com o objetivo de pacificar o país. A estimativa para que a missão da ONU deixasse o Haiti era 15 de outubro de 2016, porém, frente à instabilidade política do país e adiamento das eleições, o general Pinheiro admitiu que pode haver um atraso na retirada da missão.


A grande questão é como retirar a Minustah e conferir autonomia para que o Haiti encontre seu próprio desenvolvimento. A realização de eleições presidenciais justas seria um grande passo nesse sentido, visto que legitimaria um governo nacional e daria mais robustez às instituições haitianas. Além disso, o ato de votar e ver-se representado nas eleições é significativo para os haitianos que enfrentaram governos autoritários. Portanto, as eleições presidenciais são parte do processo de reconstrução democrática e política que é justamente um dos objetivos da Minustah e fator essencial para que o Haiti possa caminhar sozinho.


De forma mais geral, a dificuldade de planejar e operacionalizar a retirada das tropas do Haiti é reflexo do próprio modelo de missões da ONU que, ao discursar em prol de uma paz duradoura, muitas vezes perpetua a dependência do país em relação à intervenção humanitária e dificulta o complexo processo de garantir autonomia e verdadeira independência a um país que tem histórico de conflitos. Dessa forma, não se trata somente de evitar novos conflitos no Haiti, de reconstruir a infra-estrutura e estabelecer presença militar, mas de assegurar as mínimas condições para que o próprio país garanta sua soberania. Situações como a do Haiti demandam uma maior complexidade das missões da ONU e um entendimento mais profundo acerca da construção e da manutenção da paz.


[1] Houve tentativas de realizar o segundo turno nos dias 17 e 24 de janeiro e 7 de fevereiro.

[2] Oficialmente, Martelly deixou seu cargo no dia 7 de fevereiro.


Giovanna Ayres Arantes de Paiva é mestranda em Relações Internacionais no Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP) e pesquisadora do GEDES.

Destaques
Recentes
Arquivo
Busca por Tags
 
bottom of page